quarta-feira, 30 de outubro de 2013

O acesso dos cidadãos às leis municipais


Conforme havia compartilhado no artigo O portal da Câmara dos Vereadores, de 16/08, os serviços de consulta virtual à legislação municipal, bem como o acesso às licitações do nosso Legislativo, estavam "em construção" no site. Hoje novamente verifiquei que a situação ainda persiste e fui em pessoa ao setor de protocolo da Câmara confirmar as informações durante a parte da manhã.

Lamentavelmente o cidadão de Mangaratiba não tem o seu acesso facilitado às leis dentro de um local considerado como sendo a Casa do Povo. Além da internet não permitir a consulta, a pessoa interessada, caso queira conhecer o inteiro teor das normas legais não divulgadas no setor de legislação do site da Prefeitura, precisa protocolizar um requerimento e aguardar o seu deferimento pelo vereador presidente para então um funcionário da Câmara acompanhá-lo enquanto tira as xerox no comércio.

Na presente data, fui também na nossa Biblioteca Municipal e observei que lá havia somente um único exemplar da Lei Orgânica do Município, disponível para cópia mediante a retenção da carteira de identidade do cidadão pela funcionária. Mesmo assim o documento não se achava 100% atualizado se comparado com a versão existente no portal do Poder Executivo.

Vale ressaltar que nem todas as leis locais encontram-se reunidas no site da Prefeitura e que o acesso à internet ainda não está satisfatoriamente universalizado em relação a todos os munícipes de modo que sugiro o seguinte:

1) que a Câmara Municipal acelere a exibição de todas as normas municipais em seu portal na internet, criando um mecanismo de consultas por número da lei, seu ano de aprovação e assuntos pertinentes (uso de palavras chaves);

2) que todo o conteúdo das leis do Município de Mangaratiba seja disponibilizado na biblioteca pública para fins de consulta e de cópia, bem como nas sedes de cada um dos distritos dentro das respectivas administrações.

Penso que a publicidade das leis não se deve se dar somente através de órgão da imprensa local/regional e por afixação na sede da Câmara, como prevê o artigo 104 caput da Lei Orgânica. É preciso promover uma ampla divulgação dos atos municipais, quer sejam do Legislativo ou do Executivo. Afinal, esta é uma antiga reivindicação que acompanha a humanidade desde as mais antigas eras, tornando-se uma preocupação na antiga Roma do século V a.C.

De acordo com alguns relatos históricos preservados por Tito Lívio, eis que, no início da República Romana, as leis eram guardadas em segredo pelos pontífices e por outros representantes da classe dominante dos patrícios, sendo severamente aplicadas contra os plebeus. Assim foi até que, por volta de 462 a.C., o plebeu Terentilius propôs a compilação e a publicação de um código legal oficial, de modo que as pessoas de sua classe pudessem conhecer a legislação e não serem mais surpreendidas pela sua execução. Deste modo, após a superação da resistência dos patrícios, foi editada a chamada Lei das Doze Tábuas, inspiradas no grego Sólon, as quais marcaram fortemente o período republicano dos romanos.

Com muito mais razão, por vivermos numa república democrática, com o uso cada vez maior da internet, devemos ter toda a legislação municipal disponível para consulta no portal da Câmara dos Vereadores, contemplando aos objetivos educacionais expostos no artigo 310, inciso III da nossa Lei Orgânica. Portanto, é algo que precisa ser acelerado não somente para fins de conhecimento dos nossos direitos mas também para incentivarmos um melhor diálogo do cidadão com o Poder Público com base nos princípios da transparência.


OBS: Imagem acima extraída do site da Câmara Federal onde é possível pesquisar tanto as leis quanto as proposições dos nossos deputados.

domingo, 27 de outubro de 2013

Prevenção contra chuvas fortes em Mangaratiba



O verão está se aproximando e, junto com a estação quente, chegam também as chuvas intensas próprias dos meses de dezembro a março. Mangaratiba, assim como a maioria das cidades do estado do Rio de Janeiro, não está imune às enchentes e aos deslizamentos de terra. Pois, como vimos no comecinho de janeiro do corrente ano, houve várias quedas de barreiras no município provocando, inclusive, o desabamento de residências. É o que podemos relembrar lendo esta matéria publicada pela Agência Brasil de Notícias em 04/01/2013:

"(...) Estima-se que 15 mil pessoas foram afetadas. Segundo a prefeitura, 90 pessoas estão desalojadas e foram levadas para um abrigo montado na Escola Municipal Maria Augusto Lopez, onde recebem alimentos, água potável, kits para dormir e de higiene pessoal. O município é cortado pela BR-101 (Rio-Santos). Cinco casas desabaram parcialmente, sem vítimas. Devido o aumento do nível das águas, muitos moradores foram retirados de casa em barcos da Defesa Civil municipal, que também usou as embarcações para levar água potável às famílias que estão em áreas de difícil acesso, em  consequência dos alagamentos. A cidade está em estado de alerta e a água já começa a baixar. De acordo com a prefeitura, o índice pluviométrico chegou a atingir, nos últimos dois dias, 240 milímetros (mm). Acima de 100 mm já é considerado um volume grande de chuva (...)"

Felizmente, a rua onde eu moro, aqui em Muriqui, pode ser considerada um logradouro seguro, mas o mesmo não se pode dizer dos bairros Cachoeira I e Cachoeira II, além de outras localidades situadas neste e nos demais distritos. Preocupa-me o fato de que muitas residências próximas às rodovias estejam construídas irregularmente em terrenos mais vulneráveis e que comprometem a segurança de seus moradores. Devido aos problemas habitacionais do nosso país, muitas famílias nem têm condições de sair imediatamente das áreas de risco e passam a correr perigo durante praticamente todo o verão.

Uma alternativa provisória seriam os moradores desses lugares aprenderem a conviver melhor com o risco. Através do monitoramento da Defesa Civil e da própria população residente é possível organizar planos de retirada das pessoas para abrigos municipais contando também com um sistema de alarmes e alertas. Sendo constatado o perigo, as sirenes soariam para a população deixar imediatamente suas casas juntamente com o envio de mensagens SMS para os celulares já cadastrados. Vejamos, pois, o que tem sido aplicado com sucesso nas comunidades do Borel e do Morro da Formiga, Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro:

"(...) A instalação do Sistema de Alerta e Alarme começou em janeiro, com a implantação de um conjunto de sirenes no Morro do Borel, na Tijuca, uma das comunidades com alto risco de deslizamento. O sistema é acionado caso a Defesa Civil e o Alerta-Rio identifiquem que as chuvas chegaram a níveis críticos nestes locais. Com o auxílio de agentes da Defesa Civil, de lideranças comunitárias e de moradores da própria comunidade que passaram por capacitação, a população das áreas de risco é encaminhada para os pontos seguros mapeados na região. O sistema foi testado com sucesso durante as fortes chuvas que atingiram a região da Tijuca, em abril deste ano, quando nove comunidades tiveram as sirenes acionadas. Morador do Morro da Formiga, Alan Pereira é um exemplo a ser seguido. Em uma forte chuva de abril deste ano, a sirene tocou e ele não confiou no alerta. Por pouco ele, sua esposa e seus dois filhos não foram atingidos por um deslizamento, que destruiu parte da casa deles (...)" - Notícia extraída do site da Prefeitura do Rio de Janeiro

Durante os 13 anos em que vivi na cidade de Nova Friburgo, fui testemunha de duas grandes enchentes, ambas ocorridas em janeiro. A pior delas se deu quatro anos depois da calamidade de 2007. As autoridades de lá, mesmo ignorando os avisos da natureza, continuaram permitindo a construção de novas casas em lugares impróprios. Desprezaram os riscos existentes na Região Serrana. Até que, na madrugada do dia 11 para 12/01/2011, houve uma tragédia sem comparações com centenas de mortos e milhares de desabrigados, virando manchete no mundo inteiro. Algo que registrei no meu blogue pessoal quatro dias depois da luz ter sido religada no apartamento onde morava lá (ler o artigo Um dia trágico na história de Nova Friburgo, de 15/01/2011).

Não desejo assistir algo semelhante aqui em Mangaratiba e, por isso, não podemos ficar cegos para essa realidade já que o efeito estufa, em decorrência do aumento das emissões CO² na atmosfera, tem provocado tempestades cada vez mais danosas no planeta. Além do mais, as chuvas fortes são eventos previsíveis sendo um dever dos municípios cuidarem de suas respectivas encostas bem como tomarem todas as medidas cabíveis afim de zelarem pela vida, pela integridade física e pelo patrimônio das pessoas. E como o programa Minha casa, minha vida do governo federal ainda não está beneficiando todas as famílias brasileiras, resta às prefeituras ensinarem aos moradores das áreas de risco a conviverem melhor com o problema sempre que for possível, jamais deixando essas comunidades carentes marginalizadas.

Em 31/01 deste ano, a Prefeitura de Mangaratiba havia realizado uma reunião no CRAS do Parque Bela Vista que teve como tema Como agir em caso de chuvas fortes. No entanto, entendo ser necessário muito mais do que isso. Antes das tempestades fortes chegarem, o governo municipal já poderia fazer um trabalho de conscientização em cada comunidade considerada de risco, em horários que permitam uma presença e uma participação maior dos moradores. E, paralelamente, seria instalada uma infra-estrutura em todos esses locais com os sistemas de alarmes e alertas dos quais mencionei acima.


OBS: A foto acima refere-se a um dos pontos críticos onde houve deslizamento de terra no mês de janeiro deste ano conforme consta no site da Prefeitura de Mangaratiba em http://www.mangaratiba.rj.gov.br/portal/noticias/pref-e-vice-visitam-areas.html

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Uma nova concepção para o Programa Bairro Novo



Conforme noticiou mês passado o site da Prefeitura Municipal de Mangaratiba, eis que, durante uma solenidade ocorrida dia 18/09, em Praia Grande, foram anunciadas obras de asfaltamento e de infraestrutura no distrito bem como nos bairros de Batatal e de Ingaíba, a qual é considerada ainda uma área rural:

"Os locais foram escolhidos para receber o Programa Bairro Novo, do Governo do Estado, que levará mais de 7,5 quilômetros de asfalto e infraestrutura em mais de 15 ruas. O anúncio oficial aconteceu na manhã desta quarta-feira, 18, em Praia Grande, na presença do prefeito Evandro Capixaba, do vice-prefeito Dr. Ruy, do vice-governador Luiz Fernando Pezão, do secretário de Obras do Estado do Rio de Janeiro, Hudson Braga, além de outras autoridades (...) O Bairro Novo atenderá 18 ruas de Mangaratiba, com cerca de 2,5 quilômetros de asfalto para Praia Grande e mais 5,5 quilômetros de asfalto para os bairros Ingaíba e Batatal (da Rio-Santos ao Posto de Saúde). O programa contempla obras de meio-fio, drenagem, calçadas, água e infraestrutura. O Bairro Novo vai atender 2.065 ruas de 123 bairros em 19 municípios da Região Metropolitana, num total de 721 quilômetros de vias pavimentadas e urbanizadas. O investimento total das obras é de R$ 1,23 bilhão." - destaquei

Sinceramente, não acho que o governo estadual deva começar a mexer em zona rural através do asfaltamento quando há coisas mais prioritárias para serem resolvidas. Aliás, temo que seja até socialmente catastrófico promover a pavimentação de vias sabendo que, após a conclusão das obras, as localidades contempladas vão se tornar futuras áreas de expansão imobiliária crescendo desordenadamente.

Vale ressaltar que asfalto na rua não significa necessariamente mais dignidade e qualidade de vida. Muito pelo contrário! Pois, depois do transtorno das obras, as comunidades passam a sofrer com outros impactos marcados pelo aumento da população residente, uma frequência maior de acidentes automobilísticos e a poluição ambiental, notadamente o despejo in natura do esgoto nos nossos rios e córregos.

Deve-se considerar ainda que Ingaíba é uma região de natureza, com trilhas e cachoeiras, de modo que o seu meio ambiente precisa ser preservado. Mesmo sem asfalto, o lugar pode muito bem ter um satisfatório atendimento nas áreas de educação, saúde e transportes. Através da valorização do verde, a economia local seria sustentavelmente desenvolvida por meio do ecoturismo e da agricultura orgânica, em que a produção de alimentos saudáveis passaria a ser estimulada pelas compras institucionais da própria Prefeitura.

Independentemente do lugar ser beneficiado com as obras de pavimentação, defendo que a infraestrutura chegue primeiro. Em se tratando de localidades ainda com pouco habitantes, dá perfeitamente para termos estações de tratamento com biodigestores, o que auxiliaria na geração de energia. Então, uma vez existindo saneamento básico, luz, telefone, escolas, postos de saúde, linhas de ônibus regulares e policiamento, a sociedade pode discutir com seus vereadores e prefeito sobre a conveniência de asfaltarem ou não a estrada de acesso ao povoado e as ruas que lá existem.


terça-feira, 15 de outubro de 2013

O embarque para a Ilha Grande em dias de movimento



Neste último sábado (12/10), viajei para a Ilha Grande e pude testemunhar a má organização do serviço prestado pela concessionária CCR Barcas.

Tão logo cheguei ao atracadouro das barcas, cerca de uma meia hora antes, fiquei perplexo com o gigantesco tamanho da fila. Pessoas aguardavam em pé somente para comprar o bilhete sem terem a certeza se conseguiriam entrar no veículo por causa da lotação máxima de mil passageiros. Era gente com mochila, portando barracas de acampamento, muitos grupos de jovens, casais de namorados e famílias com crianças. Por ter direito à prioridade, um senhor idoso, desavisadamente, embarcou antes das suas filhas deixando-as preocupadas se entrariam lá ou não para se encontrarem com o pai. A empresa nem ao menos foi capaz de construir uma sala de espera coberta e com assentos para proporcionar um mínimo de conforto aos usuários como existe no Rio de Janeiro e em Niterói, num serviço prestado pela mesma companhia de transporte aquaviário. Acabamos partindo dali uns trinta minutos depois.

Assistindo a tudo isso, não consigo entender como que um local que recebe até turistas estrangeiros, como é o caso da Ilha Grande, ainda depende de um serviço tão obsoleto e de embarcações velhas capazes de tornar instável a locomoção dos passageiros no interior dos veículos nos dias de mar agitado. Recordo que, no trajeto de volta, as pessoas tinham que tomar muito cuidado para não caírem quando se levantavam de seus lugares para irem até aqueles sanitários espartanos. Já na ida, era praticamente impossível locomover-se lá dentro devido à super lotação e às bagagens espalhadas pelo chão.

Focando na questão do embarque, penso que o primeiro passo seria a empresa dar mais agilidade à compra do bilhete para que não haja atrasos nas partidas e nem incertezas se o consumidor vai ou não viajar. Em dias de maior movimento, como foi neste último feriado, a CCR Barcas precisa dispor de mais bilheterias e contratar funcionários extras. São poucos os guichês de atendimento!

O segundo passo seria providenciar um local coberto para acomodar os usuários que vão adquirir seus bilhetes de passagem e também depois enquanto estiverem aguardando a vez de subirem na embarcação. Aliás, o ideal seria termos uma estação aquaviária, coisa que a Prefeitura pode contribuir sendo certo que o Município terá o seu devido retorno.

A meu ver, com um bom e espaçoso terminal de barcas, Mangaratiba terá a chance de captar os turistas que vão pra Ilha Grande afim de que, numa outra oportunidade, queiram conhecer os nossos atrativos. Ali dentro, poderemos divulgar as nossas belas paisagens, passeios, roteiros ecológicos, festas e eventos culturais da cidade.

É certo que muita gente passa por aqui rumo à Ilha Grande desconhece que também temos história, monumentos, trilhas, praias, cachoeiras e picos para serem escalados. Um dia movimentado seria o momento certo para que representantes da Secretaria Municipal de Turismo fossem pessoalmente até o atracadouro e desenvolverem um trabalho de marketing, apresentando o que temos de melhor para oferecer. Ou seja, podemos fazer de um limão amargo uma doce limonada!

Embora quem viaja para a Ilha Grande esteja atrás de aventura e rusticidade, isto não significa abrir mão de serviços eficientes, seguros, pontuais, com um conforto básico dentro dos padrões atuais de qualidade e que, principalmente, respeite o consumidor. Assim, tratarmos bem o turista torna-se uma questão de inteligência porque estaremos atraindo investimentos para nossa economia local e regional. Algo que o Município e a AGETRANSP podem começar a resolver juntos com a participação de toda a sociedade interessada.


OBS: Foto extraída do site do Brasil-Escola.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Que tal termos audiências públicas distritais?



Conforme deu no noticiário de hoje, dois prefeitos no Espírito Santo, dos municípios de Vitória e de Cariacica, resolveram virar taxistas por um dia afim de ouvirem os reclames da população de suas respectivas cidades, aceitando a um convite feito pelo jornal A Gazeta. É o que consta no G1, portal da Rede Globo na internet:

"(...) Os prefeitos levaram todos os passageiros até o destino e não cobraram pela corrida. Mesmo assim, saíram ganhando. Segundo eles, conversar com os moradores de uma forma tão próxima pode ajudar na administração da cidade. “Esse contato com a população faz com que a gente ouça realmente o dia a dia do povo. E a gente tá aqui pra isso”, disse Juninho. “Táxi, salão de beleza e barbeiro são lugares onde a oportunidade de conversar com a população é muito grande. E não foi diferente”, completou Luciano Rezende."

A meu ver, precisamos de uma iniciativa semelhante aqui em Mangaratiba. Algo que permita ao prefeito, aos seus secretários de governo e aos vereadores conhecerem de perto as demandas das pessoas. E, neste sentido, nada mais prático do que promovermos periodicamente audiências públicas distritais. Ou seja, eventos que possibilitem o diálogo aberto entre a população e seus representantes no Poder Público.

Tendo em vista as peculiaridades da geografia mangaratibense, penso que nem todos os acontecimentos políticos devam restringir-se ao distrito-sede. As dificuldades de transportes, considerando aí os gastos com tarifa e o horário, seriam obstáculos para que todos os interessados compareçam a uma grande assembleia popular num local específico. Logo, veria grandes oportunidades se o prefeito agendasse esse bate-papo em cada um dos distritos com a finalidade de simplesmente ouvir o que as pessoas têm a dizer.

Nos meses de maio e de agosto deste ano, escrevi respectivamente os artigos Nossa Câmara Municipal poderia criar uma Comissão de Legislação Participativa e O portal da Câmara dos Vereadores, ambos propondo mecanismos mais democráticos que propiciem a participação popular junto ao Poder Legislativo. Contudo, apesar dessas iniciativas serem positivas e construtivas, nada melhor do que o contato direto entre o cidadão e suas autoridades constituídas. Aliás é o que já determinava a legislação de Moisés dos antigos hebreus em relação aos shofetim (juízes) de Israel:

"Nesse mesmo tempo, ordenei a vossos juízes, dizendo: ouvi a causa entre vossos irmãos e julgai justamente entre o homem e seu irmão ou o estrangeiro que está com ele." (Deuteronômio 1.16; ARA)

Podemos assim dizer que o ato de ouvir é fundamental para que sejam tomadas decisões justas, o que significa prestarmos a atenção e levarmos o próximo em consideração, esforçando-nos para entender o que a pessoa diz, considerar suas queixas e opiniões diferentes, dando todas as condições possíveis para que o outro exponha suficientemente tudo.

No hebraico, a palavra Leha'azin ("escutar") deriva de Izun, o que significa "equilíbrio". Isto transmite a ideia de que entre eu e o meu próximo deve existir um equilíbrio, tal como o labirinto do ouvido interno, afim de que haja a oportunidade para o outro desabafar as queixas que têm com as suas palavras. E o diálogo dessa forma proporciona a compreensão e a harmonia entre as pessoas, criando laços de proximidade entre elas quando estão até mesmo em posições contrárias.

No mês de julho, durante sua visita ao Brasil, o papa Francisco ressaltou a importância da "cultura do encontro" e creio que é por aí que devemos avançar. Senão vejamos o que disse o pontífice católico em seu discurso no Theatro Municipal do Rio de Janeiro:

"(...) termino indicando o que tenho como fundamental para enfrentar o presente: o diálogo construtivo. Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo. O diálogo entre as gerações, o diálogo com o povo, a capacidade de dar e receber, permanecendo abertos à verdade. Um país cresce, quando dialogam de modo construtivo as suas diversas riquezas culturais: cultura popular, cultura universitária, cultura juvenil, cultura artística e tecnológica, cultura econômica e cultura familiar e cultura da mídia. É impossível imaginar um futuro para a sociedade, sem uma vigorosa contribuição das energias morais numa democracia que evite o risco de ficar fechada na pura lógica da representação dos interesses constituídos. Será fundamental a contribuição das grandes tradições religiosas, que desempenham um papel fecundo de fermento da vida social e de animação da democracia. Favorável à pacífica convivência entre religiões diversas é a laicidade do Estado que, sem assumir como própria qualquer posição confessional, respeita e valoriza a presença do fator religioso na sociedade, favorecendo as suas expressões concretas. Quando os líderes dos diferentes setores me pedem um conselho, a minha resposta é sempre a mesma: diálogo, diálogo, diálogo. A única maneira para uma pessoa, uma família, uma sociedade crescer, a única maneira para fazer avançar a vida dos povos é a cultura do encontro; uma cultura segundo a qual todos têm algo de bom para dar, e todos podem receber em troca algo de bom. O outro tem sempre algo para nos dar, desde que saibamos nos aproximar dele com uma atitude aberta e disponível, sem preconceitos. Só assim pode crescer o bom entendimento entre as culturas e as religiões, a estima de umas pelas outras livre de suposições gratuitas e no respeito pelos direitos de cada uma. Hoje, ou se aposta na cultura do encontro, ou todos perdem; percorrer a estrada justa torna o caminho fecundo e seguro (...)" - ler o discurso do papa na íntegra

Embora o que o papa falou também se aplique às relações entre grupos religiosos, quero focar aqui mais na questão política brasileira e local. Como iremos formar verdadeiramente essa "cultura do encontro" sem hipocrisias?

Há tempos que as nossas leis têm criado organismos de participação e de representação popular. São comitês, conselhos disto e daquilo, bem como audiências públicas divulgadas somente na imprensa oficial, consultas pela internet, entre outros meios de expressão mas que apenas fingem ouvir o cidadão. A insatisfação continua na sociedade brasileira e nada é resolvido.

No entanto, vejo que o problema maior está na surdez dos nossos governantes que ainda não foram capazes de abraçar o "diálogo construtivo". É um problema ético da nossa nação! Os municípios brasileiros criaram seus conselhos de saúde, educação, transportes, meio ambiente e tantos outros temas administrativos, mas os senhores prefeitos precisam conhecer mais de perto as demandas populares e se comprometerem verdadeiramente com o diálogo. Muitos viram nesses organismos participativos uma maneira de conterem ou de acalmarem ilusoriamente as entidades da sociedade civil que antes compareciam às ruas causando dores de cabeça aos políticos. Outros governantes, porém, jamais entenderam o significado de chamar a população para se sentar em volta de uma mesa e debater conscientemente sobre os problemas da cidade. Tentam até hoje cooptar lideranças e intervir na representação das associações de moradores, de ONGs e sindicatos, corrompendo assim a democracia.

Como estabelecer o processo de diálogo entre um governante e seu povo se aquele impede e dificulta que este se faça ouvir nos meios onde possa haver o encontro?!

Desejo profundamente que os nossos políticos entendam como se comportarem numa democracia, permitindo ao cidadão dizer tudo o que ele sente e pensa, encaminhar quais as suas reais demandas, bem como fazer conhecido aquilo que ele propõe. Em seu discurso, Bergoglio mencionou que esta "estrada justa" torna o caminho, além de seguro, "fecundo". Ou seja, todos podem sair ganhando com o diálogo construtivo. Governar com democracia verdadeira certamente dá trabalho, mas produz resultados excelentes. Pois, se um prefeito estiver disposto a ouvir o povo, ele poderá tomar as decisões mais acertadas para o bem da coletividade. Por isso, os organismos de participação precisam ser respeitados em todos os aspectos e a população encorajada a se manifestar em suas audiências públicas.

E então, Mangaratiba? Vamos encarar o desafio?