domingo, 7 de maio de 2023

Todas as audiências públicas deveriam permitir a participação social por videoconferência!



Acompanhando as publicações no Diário Oficial do Município de Mangaratiba, divulgadas na semana passada, observei uma convocação do Prefeito, senhor Alan Campos da Costa, para a audiência pública sobre as metas fiscais para o 1° Quadrimestre de 2023, prevista para ocorrer no dia 29/05, às 09 horas, no Plenário da Câmara Municipal.


Para quem não sabe, a audiência pública sobre a demonstração e avaliação do cumprimento das metas fiscais é uma exigência legal. Trata-se de dar cumprimento ao disposto no parágrafo 4° do artigo 9° e no artigo 48, ambos da Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000, a "Lei de Responsabilidade Fiscal". Senão vejamos:


"Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subsequentes, limitação de empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias. 

(...)

§ 4º Até o final dos meses de maio, setembro e fevereiro, o Poder Executivo demonstrará e avaliará o cumprimento das metas fiscais de cada quadrimestre, em audiência pública na comissão referida no § 1 do art. 166 da Constituição ou equivalente nas Casas Legislativas estaduais e municipais."


Deste modo, a audiência pública de metas fiscais, como o próprio nome sugere, tem por objetivo demonstrar o alcance das metas fiscais traçadas pelo Poder Executivo de um ente federativo que, uma vez planejadas, devem, em regra, ser cumpridas.


Como cidadão, desde 2019 venho acompanhando essas audiências, tendo, inclusive, participado de algumas delas. E, não muito depois que foram adotadas as excepcionais medidas de afastamento sanitário da COVID-19, ao verificar que não seria permitida a participação presencial dos cidadãos na audiência referente ao segundo quadrimestre de 2020, escrevi, em 26/09 daquele ano, o texto Uma audiência pública sem público em Mangaratiba... nas redes sociais, questionando a ausência de disponibilização de ferramentas existentes no meio eletrônico que permitissem o interessado não só assistir ao vivo a reunião como também interagir. Além disso, enviei e-mail à Secretaria Municipal de Finanças com cópia para a Ouvidoria da Prefeitura a fim de que fosse viabilizada a transmissão virtual do evento, mas não obtive êxito.


Confesso que não foi tão fácil lutar por isso e precisei até abrir uma denúncia na nossa Corte de Contas do Estado do Rio de Janeiro, o que gerou o Processo TCE-RJ n.º 227.118-8/20, sendo que, na Decisão Plenária de 25/11/2020, os conselheiros do órgão de controle externo deliberaram pela comunicação ao Prefeito Municipal de Mangaratiba para prestar esclarecimentos quanto à não disponibilização de ferramenta digital com vistas a possibilitar o acesso virtual do público interessado à audiência realizada no dia 25/09/2020, juntando aos autos a respectiva ata. Em seu voto, o eminente relator Christiano Lacerda Ghuerren acompanhou o exame feito pela unidade técnica do Corpo Instrutivo do TCE em que transcreveu parte da fundamentação adotada, acolhendo o correto posicionamento:


"(...) Sendo assim, cumpre comentar que a forma adotada pela Prefeitura de Mangaratiba para a realização da audiência pública do 2º quadrimestre de 2020, sem a alternativa de acesso do público interessado por uma plataforma digital, não parece ter ocorrido nas condições mais adequadas, tendo ocasionado uma restrição desmedida da participação popular no evento e possivelmente não cumprindo a contento o disposto no § 4º do artigo 9º da Lei Complementar Federal nº 101/2000." (José Roberto Gomes de Sousa, Assessor da 3ª Coordenadoria de Auditoria de Contas, em 27/10/2020) 


Acrescente-se que, na sua sessão telepresencial de 16/06/2021, o TCE deliberou no sentido de novamente comunicar ao Prefeito Municipal de Mangaratiba para que não somente apresentasse um melhor detalhamento e comprovação da divulgação da audiência pública para a avaliação do cumprimento das metas fiscais do 2º quadrimestre de 2020, ocorrida em 25/09/2020, como também informasse quais medidas estariam sendo adotadas com o intuito de aprimorar o acesso do público interessado às audiências realizadas durante a pandemia. E, na terceira submissão plenária, ocorrida em 2022, por considerar que houve o aprimoramento dos instrumentos viabilizadores das audiências públicas na municipalidade, houve o entendimento por arquivar a Denúncia que foi julgada procedente


Pelo menos durante a vigência das medidas mais rígidas de afastamento social impostas pelas condições da COVID-19, cujo estado pandêmico ainda não acabou, podemos dizer que decorreu uma obrigatoriedade lógica para que os entes federativos fossem obrigados pelas circunstâncias a oferecer à população a alternativa de participar virtualmente das audiências públicas por meio de aplicativos de videoconferência como o Zoom ou o Google Meet. No entanto, penso que o fim da emergência sanitária (ou ainda que fosse o término da pandemia) jamais deveria servir de motivo para que os municípios cessem o uso das plataformas eletrônicas.


A meu ver, a alternativa de participação de audiências públicas pelo meio virtual constitui um avanço do qual a sociedade civil não pode abrir mão pois tem a ver com a acessibilidade e também com o princípio da transparência.


Ora, num município de graves problemas relacionados à mobilidade urbana como é Mangaratiba, com a população espalhada por vários povoados, bairros e localidades de seis distritos diferentes, inclusive vivendo em ilhas, a participação de toda e qualquer evento público, por meio de videoconferência, torna-se uma necessidade quando houver direito de voz ao cidadão. Sem contar que o horário das 09 horas de um dia útil, previsto para a realização da audiência sobre as metas fiscais, coincide com o horário das atividades laborais da maioria dos trabalhadores, o que, na maioria das vezes, impossibilita o deslocamento do interessado ao Plenário da Câmara Municipal.


Desse modo, assim que foi publicado o edital de convocação na recente edição n.º 1807 do Diário Oficial do Município, quanto à audiência do primeiro quadrimestre de 2023, porém sem prever a participação dos cidadãos por meio de uma plataforma digital, abri logo uma solicitação na Ouvidoria da PMM de protocolo número 202305000017. Em minha manifestação não só solicitei que o Relatório de Gestão Fiscal seja disponibilizado com antecedência de, no mínimo, uns 10 (dez) dias como também que houvesse a possibilidade de qualquer interessado acompanhar de maneira interativa, em tempo real, por videoconferência, pela disponibilização prévia de um link, considerando haver na atualidade recursos tecnológicos para tanto. 


Como já coloquei, a participação virtual permite que muitos cidadãos acompanhem a gestão pública e interajam à distância, tendo em vista a incompatibilidade de horário com as obrigações laborais e as dificuldades de mobilidade urbana dentro do próprio Município. E, considerando que os tempos da pandemia aceleraram o uso dos meios de informática nas comunicações, entendo que os órgãos públicos não devem retroceder voltando a fazer eventos exclusivamente presenciais. Ou seja, as audiências públicas de agora em diante, mesmo sem o risco sanitário dos anos de 2020 e 2021, precisam ser realizadas na forma híbrida. 


Tendo em vista que não podemos ficar na dependência do bom senso dos nossos gestores, coisa que não existe em Mangaratiba, sugiro que a Câmara Municipal aprove uma lei a fim de tornar obrigatória a realização de audiências públicas no Município sempre com transmissão em tempo real pela internet como mecanismo de participação popular na gestão da administração pública. E tal proposta, mesmo dependendo da adição de futuro ato regulamentador, certamente serviria de incentivo para reforçar o uso de uma forma de participação popular capaz de garantir acesso à informação, à publicidade e a transparência aos atos administrativos.

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