quinta-feira, 7 de julho de 2016

O acesso aos processos na Prefeitura pelos advogados




Em dezembro do ano passado, entrei em contato por e-mail com a Comissão de Prerrogativas da OAB/RJ a fim de questionar certos procedimentos abusivos adotados pela Prefeitura Municipal de Mangaratiba quanto aos direitos dos advogados em retirar os autos de processos administrativos para fins de cópias, denunciando o seguinte:

"Na manhã desta sexta-feira (11/12/2015), compareci à Src. Municipal de Fazenda de Mangaratiba, situada na Pra. Robert Simões, n.º 92, Município de Mangaratiba, RJ, para acompanhar o andamento do Processo Administrativo de N.º 11.557/2014 no qual figuro como interessado requerente.
Ocorreu que desejei obter cópias do referido processo, o que me foi negado pelos funcionários do setor. Indignado, fui até à Procuradoria Geral do Município e o advogado que me atendeu disse não ter ordens para permitir que eu fizesse cópias do processo e que nem poderia a Prefeitura disponibilizar um funcionário que me acompanhasse na obtenção de cópias como houve numa ocasião anterior ocorrida este ano.
Acontece que o Estatuto da Advocacia é claro em seu art. 7º, item XIII quando diz que é direito do advogado "examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos" de maneira que a negativa da Prefeitura de Mangaratiba constitui uma violação que deve ser investigada e combatida pela OAB.
Acrescento que já havia entrado em contato anteriormente com esta Comissão para tratar desse tipo de problema mas recebi a notícia de que minha representação havia sido arquivada. No entanto, eis que agora surgiu um fato novo em que, além do advogado ser impedido pela Prefeitura de tirar o processo administrativo para fins de cópias, também não é mais acompanhado por um funcionário da Administração Municipal.
Sendo assim, peço à CDAP que tome as devidas providências contra a Prefeitura de Mangaratiba e que seja adotada uma solução não somente para o meu caso específico mas que também possa abranger a todos os advogados a fim de que se estabeleça no referido Município um procedimento transparente a respeito da obtenção de cópias de processos administrativos.
Aguardo deferimento,"

Tal reclamação deu origem ao processo administrativo DAP/8.605/2016 dentro da própria OAB fluminense que expediu uma comunicação à Prefeitura de Mangaratiba. Esta, ao ser notificada, apresentou a sua resposta por meio de sua sub-procuradora (Ofício de n.º 300/2016) dando esclarecimentos a meu ver nada convincentes:

"Em atenção a legislação vigente, o Município de Mangaratiba, permite, mediante apresentação da carteira da Ordem dos Advogados do Brasil, examinar os autos de processos administrativos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, podendo neste ato realizar, se for de seu interesse, fotos, escaneamento ou algo análogo pára fotocópia.
Entretanto, para obtenção de cópias físicas, fica condicionado ao requerimento de inteiro teor, que deve ser protocolizado no setor de protocolo.
O setor de Protocolo, vinculado na Secretaria Administração é semelhante ao Cartório do Tribunal de Justiça, por isso, no caso em tela, como os autos objeto do presente requerimento estavam com carga para Secretaria de Fazenda, não podendo, neste ter acesso, pois a Secretaria competente para realização de disponibilização é a de Administração, no setor de Protocolo.
Devendo, neste caso, para ter acesso ao processo administrativo realizar requerimento, no setor de protocolo, como ocorre rotineiramente em outros órgãos, como, por exemplo, em delegacia de polícia, que, em alguns casos, deve fazer requerimento ao Delegado para disponibilização dos autos."

De acordo com as informações prestadas pela Administração Municipal, o acesso direto e imediato às cópias pelo advogado, sem a necessidade de requerer o inteiro teor, ocorre somente no setor de Protocolo, mediante o uso de fotografias, escaneamento ou algo análogo. Em outras palavras, a Prefeitura confessou não permitir que o profissional retire e depois devolva os autos para fins de reprografia, não podendo, a princípio, nem vê-los, caso o processo esteja tramitando em outro lugar, tipo na Secretaria de Fazenda, por exemplo. 

Acontece que, ao agir desse modo, a Prefeitura de Mangaratiba viola os incisos de XIII a XVI do artigo 7º do Estatuto da Advocacia, conforme a melhor interpretação que podemos fazer da Lei. Pois o item XIII, quando dispõe que o advogado tem o direito de "examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento", assegurando a obtenção de cópias, certamente o legislador pretendeu assegurar pelo menos dois direitos sobre os quais abordarei mais adiante: o de consultar processos e de obter cópias fazendo apontamentos.

1) O direito de consultar o processo: Não importa onde estejam os autos, se no protocolo, numa secretaria, no gabinete do prefeito ou na Procuradoria Geral do Município. Basta o advogado se apresentar e dizer aquilo ele deseja, de modo que os funcionários devem dar vistas ao causídico o mais rápido possível para não fazê-lo perder tempo. E aí, se uma prefeitura quer dar acesso direto aos autos apenas no protocolo, então que os funcionários vão até onde está situado o processo e o busque. Do contrário, o advogado deve ter o direito de ingressar no órgão onde estiver o processo, pedir para vê-lo e examinar tudo o que for de seu interesse.

Nunca podemos também esquecer que o mesmo diploma jurídico em comento assegura ao advogado o direito de ingressar "em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público" no qual ele precise "praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado".

Neste sentido, considero como um evidente embaraço ao exercício da profissão se, ao comparecer no protocolo, o advogado ainda tiver que formular requerimento por escrito para, enfim, ter acesso aos autos do processo por estes se encontrarem em outro órgão interno da Administração local. Até porque, em tal caso, o requerimento não será imediatamente analisado e o procedimento só vai servir para causar mais demora em nossa atividade profissional, importando em perda de tempo e permitindo que, na prática, a disponibilização do processo ocorra só quando os agentes públicos realmente quiserem que se tenha vistas.

Ora, não caracterizaria um procedimento destes uma violência institucional?!

2) O direito de obter cópias e tomar apontamentos: Ao ter acesso ao processo, o advogado deve ter respeitado o seu direito de fazer cópias, seja retirando os autos do local ou recebendo imediatamente a cópia do funcionário. Apesar da evolução tecnológica hoje permitir que as cópias sejam também obtidas pelas câmeras de aparelhos celulares formando fotografias digitais, não podemos por isso excluir, por enquanto, o direito de se obter cópias físicas. Até mesmo porque, enquanto os dois sistemas de processos coexistirem, isto é, os físicos e eletrônicos, constituirá um embaraço para o profissional alguém impedir que os advogados possam de pronto confeccionar as cópias físicas que lhes interessarem.

Ademais, por tratar-se a certidão de inteiro teor de uma espécie de autenticação de cópias do processo feita pela própria Prefeitura, este nada mais é do que um serviço extra prestado ao cidadão capaz de fornecer um novo documento público a ser criado. Ou seja, o ato de entregar cópias que serão numeradas e rubricadas pelo funcionário distingue-se da simples reprodução do inteiro teor de um processo feita em qualquer máquina de xérox. Esta reprodução ocorre livre de tributação enquanto que, na certidão de inteiro teor, a Administração costuma ser remunerada pelo pagamento de uma taxa que o contribuinte precisa pagar pedindo a emissão de uma boleta no próprio ente público e preenchendo um formulário físico.

Finamente, consideremos que o advogado também pode querer confeccionar o mais rápido possível cópias autenticadas em cartório para qualquer fim específico do interesse do cliente, algo que a Administração Municipal não tem o direito de condicionar ao pedido de inteiro teor já que a certidão não é fornecida imediatamente após a apresentação do requerimento no protocolo. Pois o que ocorre é que tal pedido vai gerar a formação de um novo processo, com capa e numeração de folhas, em que, após a constatação do efetivo pagamento na rede bancária, o funcionário irá efetuar uma busca interna e, dentro do prazo determinado de dias, disponibilizar as cópias no Protocolo da própria Prefeitura.

Portanto, não assiste razão à Prefeitura Municipal de Mangaratiba em recusar cumprir as determinações expressas no Estatuto da Advocacia, cabendo à OAB/RJ tomar as providências necessárias para que os advogados tenham acesso aos autos de processos administrativos conforme disciplina a legislação. Nem que, para tanto, seja proposta uma ação judicial em face do ente público reclamado.

Assim, como a Prefeitura de Mangaratiba não possui dono, sendo o prefeito e seus secretários meros gestores da coisa pública, entendo que também podemos influenciar politicamente uma mudança a esse respeito. Logo, nada impede que o chefe do Executivo a qualquer momento reveja os seus procedimentos e, por meio de um decreto, discipline os meios corretos através dos quais os advogados poderão retirar os processos administrativos para fins de carga e de cópias, sem criar embaraços para o exercício da profissão.


OBS: Ilustração acima extraída de uma página da OAB/RJ na internet, conforme consta em http://www.oabrj.org.br/prerrogativas.html

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